terça-feira, 7 de abril de 2009

Quilombo de Castelo

Castelo

A comunidade remanescente de quilombo de Castelo, formada aproximadamente, no final do século XIX, localiza-se à 35 quilômetros da sede do município de Alcântara, tendo um trecho da estrada asfaltado e 14 quilômetros mesma é de piçarra (pedregulhos marrons), em condições de acesso bastante precárias. Este problema da estrada já comemorara 14 anos sem que os diversos governantes tenham dado a ele uma solução. Nem mesmo com a instalação do Centro de Lançamento de Alcântara, desde 1986, que causou desalojamento, quase um ato étnocida, contra 49 outras comunidades que tiveram que sair de suas terras de origem por conta da desapropriação feita pela Base, trouxe benefícios para a população do município, pois a principal estrada era uma verdadeira cratera. Enquanto são lançados foguetes para o espaço o povo padece por não ter uma estrada em condições de transitar com tranqüilidade e sem correr o risco de acidentes. Como meio de transporte, mais ou menos regular, há uma linha de ônibus que sai da sede de Alcântara todos os dias, logo depois da chegada da lancha, por volta das 8 horas e retorna , passando próximo à comunidade, às 13 horas. Quando falta este meio de transporte, que além de pessoas leva no seu interior, no bagageiro, porcos cabras, galinhas, farinha, camarão seco e/ou fresco, etc., é comum a utilização do “pau-de-arara” que carrega literalmente tudo. Alcântara é um município que conforme estimativa da FNS – Fundação Nacional da Saúde, em 1996, tinha 3.623 pessoas na área urbana e 16.503 na rural. Está localizado a 22 km., por mar, distante da Capital do Maranhão – São Luís. Em Castelo existem 53 famílias residentes com uma população de 193 pessoas, sendo 42 crianças de 0 a 6 anos, as quais eram atendidas, quando da implantação do projeto. Não existe calçamento asfáltico ou de qualquer outro tipo nas ruas, as residências são distribuídas obedecendo às necessidades dos moradores. As casas construídas são de taipa, em sua maioria. Contam com energia elétrica, porém com atendimento precário, chegam ficar semanas sem ela. Há, atualmente, uma casa feita de tijolos pertencente ao senhor Antonio Moraes, a pessoa mais antiga da comunidade, que conta com 85 anos de idade. Após nossa entrada no Projeto, e um trabalho de mobilização no sentido de reivindicar do poder público melhoramentos para a comunidade, foi instalado um poço artesiano e feita a ligação da água nas casas dos moradores – através de mutirão. Antes o abastecimento era feito por meio de “poços, sendo um para beber e outro para banhar e lavar roupa”(Dona Mocinha)9 .
Não há posto de saúde em Castelo ou em localidades próximas. Seus/as moradores/as têm de recorrer ao atendimento, precário, fornecido pelo Hospital da sede do Município, ou seja, têm de viajar 35 quilômetros para serem atendidos e/ou tratados. Inexiste, também, posto telefônico, o que prejudica enormemente a comunidade em uma emergência. Há uma escola, a Unidade Escolar Naiza Araújo Leite, instalada em um prédio com duas salas, cobertas com telhas de amianto, tendo atualmente dois ventiladores em cada uma. A escola funcionava “em dois turnos com 25 alunos/as na primeira série, 8 alunos na segunda e 10 alunos/as na terceira, não havendo separação de salas por série. Contíguo ao prédio há dois banheiros, sem uso, pois não há caixa d’água na escola. Não existe, também, um local para preparar a merenda dos/as alunos/as. Em 1998, havia uma professora e um professor lecionando na comunidade, ambos passaram por uma capacitação quando da organização do Seminário: O Papel da Educação no Resgate da Identidade e Auto-Estima das Crianças Negras, em 22.08.98, em S. Luís, envolvendo professores/as que lecionavam nas duas comunidades – Castelo e São Cristóvão - iniciativa do técnico da Área de Desenvolvimento Comunitário, do Projeto. Atualmente a escola atende alunos/as , da comunidade e de localidades vizinhas, até a 6ª série e conta com mais duas pessoas lecionando – um professor e um professor. No centro da comunidade, em uma espécie de praça, há uma igreja católica dedicada a N.S. da Batalha, celebrada com festa, anualmente, nos dias 25 e 26 de novembro. Logo em frente, há uma televisão pública que não funciona. Às tardes as pessoas se reúnem nos bancos da praça para “um dedo de prosa”. Ao lado da escola fica a “Tribuna” onde são realizadas as festa dançantes, e, que é improvisada como “sala de aula” para as turmas de alunos que a Escola não comporta por ter somente duas salas. Outro local de lazer, na comunidade, é o campo de futebol utilizados tanto pelos homens quanto pelas mulheres que também têm um time. Existem duas “quitandas” onde são comercializados secos, molhados e, muito esporadicamente, legumes e frutas. Há um cemitério na localidade. Na atividade agrícola destacam-se as produções de: mandioca, milho e arroz com características para subsistência complementada com a pesca, por vezes com a caça e produção de farinha nas duas “casas de farinha” existentes. Criam galinhas, patos e porcos, presos ou soltos. Alguns, também, criam vacas. Os/as moradores/as não têm a titulação de suas terras, aguardam desapropriação por parte do INCRA que iniciou em 1999 a demarcação. O Tambor de Crioula10, enquanto uma manifestação cultural afro-brasileira, era dançado na comunidade por ocasião dos festejos da padroeira local momento em que o profano e o religioso unem-se para aglutinar os retirantes – que moram na diáspora de Castelo, Cambôa, em São Luís. As comemorações alusivas a N.S. da Batalha, em várias ocasiões, tem como “donos da festa” castelenses residentes na Cambôa. O Tambor de Mina11 era tocado muito amiúde “às escondidas”.


9 Herminia da Conceição Ribeiro Gusmão, 65 anos, líder comunitária de Castelo, mais conhecida com Mocinha. Devido sua liderança na comunidade arriscou na política saindo candidata a vereadora por duas ocasiões, “para brigar pelo povoado”. Casou pela primeira vez com um branco que só viu na frente do juiz. É que a família do noivo não aceitou a união, e dona Mocinha ficou com o filho na barriga, sozinha no mundo. Chegou a estudar no Orfanato e Casa da providência em São Luís, mas teve que refazer o caminho da roça. Casou pela segunda vez, teve outros 6 filhos, e hoje cria com todo o carinho o neto Dailson, de 5 anos”. ( Marilda Mascarenhas, Brincando e aprendendo uma nova lição, O Imparcial, 28.12.1997, p.13 e 14, S. Luís, MA).

10 Tambor de Crioula segundo Domingos Vieira Filho “É sem dúvida uma dança que nos veio no bojo de escravidão negra-africana ...” é um batuque, caracterizado, do ponto de vista coreográfico, pela umbigada, que entre nós tem a designação de Punga. ( Reis, 1999:35).

11 Tambor de Mina denominação da religião de origem daomeana cultuada no Maranhão que tem como referência maior a Casa das Minas, conforme com Arthur Ramos (1979)em A Casa das Minas, de Nunes Pereira (ps. 14,15,16 e 17).